sexta-feira, 13 de julho de 2012

Uma cidade vigiada

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Se os moradores de Belo Horizonte atendessem sempre ao aviso “Sorria, você está sendo filmado”, passariam boa parte do dia com cara feliz, mostrando os dentes. A sensação de insegurança, um problema crônico das grandes metrópoles brasileiras, é o que motiva a procura por sistemas de vigilância. Só com circuitos fechados de TV, segundo dados da Associação Brasileira de Empresas de Sistemas Eletrônicos de Segurança (Abese), os belo-horizontinos gastaram 144 milhões de reais no ano passado. Considerando 1 100 reais como o preço médio de uma câmera, a entidade estima que cerca de 130 000 novos equipamentos tenham sido instalados em imóveis da cidade ao longo de 2011. É como se cada grupo de dezoito moradores ganhasse uma câmera nova. Neste ano, a previsão é de que esses números aumentem 11%. Na capital, os crimes violentos contra a pessoa, que incluem roubos, homicídios e sequestros, cresceram 12% em 2011, em comparação com o ano anterior. Foram 19 487 ocorrências, o que assusta cidadãos como a servidora aposentada Rosaura Marques. No último mês de dezembro, depois de uma onda de assaltos na rua onde mora, a Jaú, no bairro Paraíso, ela investiu 4 000 reais na instalação de um sistema de vigilância em sua casa. “Agora me sinto mais tranquila”, conta.
Os principais consumidores desse tipo de equipamento são hoje os condomínios residenciais e comerciais, que respondem por 65% das compras. “Como o comércio de rua e as residências já tomavam essa precaução fazia mais tempo, os bandidos começaram a migrar para os condomínios”, explica o diretor da Abese em Minas Gerais, Vitor Hugo Moreira. A vigilância eletrônica costuma também ser mais econômica. “Onde seriam necessários quatro vigias, por exemplo, o número cai para um ou dois quando há câmeras”, compara Moreira, que também é sócio da empresa Semax. Os sistemas mais simples, utilizados em casas e pequenos estabelecimentos comerciais, podem ser instalados por valores a partir de 4 000 reais. Já o preço dos circuitos mais complexos, como os usados nos grandes shoppings, pode ultrapassar a casa do milhão.
Graças ao avanço da tecnologia, é possível acompanhar de qualquer lugar a movimentação em determinado local, em tempo real, pelo smartphone. Por 9 000 reais, o engenheiro Márcio Túlio Ottoni providenciou a instalação de um desses modernos circuitos no prédio do qual é síndico, na Rua Saldanha da Gama, na Floresta. “Temos câmeras na rua, no elevador e na garagem”, diz. O valor foi rateado pelos 28 apartamentos do edifício. “Acesso as imagens pelo telefone quando estou chegando em casa para ver se não tem nenhum problema.”
Nem sempre, porém, a instalação de câmeras é garantia de tranquilidade para os moradores e proprietários de estabelecimentos comerciais. Ignorando o risco de a ação ficar registrada, assaltantes abusados têm invadido também imóveis monitorados, como ocorreu com o restaurante 2012, na Rua Levindo Lopes, no coração da Savassi. A proprietária Juliana Myrrha pagou 7 500 reais para monitorar o funcionamento da casa sem ter de estar presente lá o tempo inteiro. Mas o sistema não conseguiu afugentar os bandidos, que invadiram o estabelecimento no mês de março. Apesar das imagens, o suspeito não foi capturado pela polícia. Mesmo assim, Juliana viu serventia no investimento. “Pelas imagens, pude identificar por onde o ladrão entrou”, lembra. Com a informação, a empresária percebeu que precisava tomar providências adicionais: reforçou a segurança com cerca elétrica e grades nas janelas. Coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos da PUC Minas, o especialista em segurança pública Robson Sávio considera ilusória a ideia de que a instalação das câmeras vai coibir a ocorrência de crimes. “A polícia não consegue investigar todos os casos registrados na cidade”, afirma. “As de­­legacias estão abarrotadas, e só crimes de grande repercussão são selecionados en­­tre os milhares de ocorrências.”
Segundo o major Gilmar Marcone Freitas, chefe de comunicação da Polícia Militar de Minas Gerais, os circuitos de TV devem ser encarados como um bom complemento ao trabalho dos policiais. Ele condena, porém, a ação das empresas do setor que, interessadas em aumentar o faturamento, contribuem para difundir um clima de insegurança na comunidade. “Quem vende a neurose é quem quer vender o remédio”, afirma. Freitas acredita que iniciativas como a Rede de Vizinhos Protegidos são mais eficazes do que a instalação de aparatos eletrônicos. O projeto, que vem sendo posto em prática pelos seis batalhões da PM, estimula a aproximação entre os que moram próximo. Quando alguém viaja, por exemplo, outra pessoa fica encarregada de avisar a polícia sobre qualquer movimentação suspeita na casa vazia. Resume o major Freitas: “A câmera funciona como um quarto olho, que vem depois do dono, do estado e da sociedade”.

Revista Veja Belo, Horizonte/MG,2012julho.

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